Assassin's Creed III: Liberation
O spin-off de Assassin's Creed III traz bastante conceitos novos ao PlayStation Vita. É em Liberation que a Ubisoft teve a oportunidade de criar uma versão portátil da série que faça jus ao que é feito nos consoles há anos, após o fraquíssimo Bloodlines e os numerosos títulos para smartphones. O plano é ousado: uma mulher negra no papel principal. Além de Urban Chaos, poucos títulos se arriscaram por esse cenário, o que chega a ser absurdo, já que protagonistas mulheres não deviam mais ser novidades para ninguém, muito menos ganharem destaques por seu tom de pele, mas Liberation explora a temática com sensibilidade e sem esconder as problemáticas por trás da posição da moça.
“
O combate não é o maior foco do enredo de Aveline. Os inimigos
aparecem em quantidades menores e o combate é simplificado a um botão de
ataque, outro de contra ataque, um de chute e um para longas distânciasLady Liberty
Aveline, assim como Connor, Ezio e Altair, possui o sexto sentido conhecido como Eagle's Vision dentro do folclore de Assassin's Creed. A história da assassina, porém, não é explorada a exaustão durante o enredo de Liberation. A moça é filha de um rico mercador francês, casado com uma escrava africana recém-liberta, que sumiu aos olhos de Aveline, durante uma feira de venda de humanos. A mistura genética da protagonista a encaixa em uma posição semelhante à de Connor, mas o ponto de vista é mais socioeconômico do que o irmão mais velho de Liberation nos consoles. A motivação principal de Aveline, a razão pela qual a garota busca a verdade, é o nojo que ela sente ao perceber os extremismos da sociedade, entre os pobres e os ricos, entre os trabalhadores escravos e o resto da população.
As ruas estreitas e populosas do mapa de Nova Orleans permitem que a jogabilidade clássica da série se encaixe bem no portátil. Ao apertar o botão direito do Vita, os jogadores podem começar a escalar prédios, pular de telhados para telhados, fugir por árvores e presenciar todo o parkour clássico da franquia. Em outro mapa, um pântano quase surreal entra em voga, em um cenário que traduz os "bayous" típicos do estado de Lousiana. É algo semelhante aos manguezais, que atuam como uma transição entre os ambientes terrestres e marinhos. Os tons verdes e as construções com cara de ruínas, aliadas a forte simbologia voodoo de elementos espalhados pelo cenário, deixam bem claro que a raíz africana de Aveline mora por aqui. Por último, a protagonista poderá explorar a cidade maia de Chichén Itzá, no México, casa de uma comunidade escrava supostamente livre. Neste trecho, faço questão de não entrar em spoilers: é aqui que a Aveline topa com as cenas mais grandiosas e divertidas do jogo, que se liberta de muitas das amarras que deixam a experiência single-player menos confortável do que devia ser, sem pretensão alguma.
A transição dos gráficos pomposos dos consoles para o Vita prefere optar pela qualidade no lugar de quantidade. Os mapas são menores, mas são variados e não soam repetitivos. Os cenários, recheados de árvores, prédios e afins, soam orgânicos graças a escolha. Por consequência, a quantidade de colecionáveis e tesouros espalhados pelo mapa também diminui, mas a escolha ajuda na direção, que parece mais centrada e focada do que as versões para consoles. Particularmente, meu problema com títulos open-world sempre foi a direção quase nula em certos pontos, algo inevitável, e Liberation não traz o incômodo para o portátil. As funcionalidades do Vita, raramente exploradas da maneira correta, são o ponto fraco da versão.
Assim como a Sony Bend fez com Uncharted: Golden Abyss, a Ubisoft Sofia inventou algumas mecânicas desengonçadas para as telas sensíveis ao toque do PlayStation Vita. Abrir cartas utilizando as duas telas, simulando a abertura de um envelope e (esta, com certeza, a pior) a "identificação" de segredos ao apontar as cartas para um foco de luz, soam desnecessárias e estão presentes no jogo sabe-se lá por qual motivo. Algo semelhante acontece com o modo online. O sistema utiliza uma mecânica de batalha por cartas, semelhante à Risk. Demora um tempo para entender o funcionamento, já que o jogo não faz questão alguma de introduzir certos elementos e não é nada parecido com o que dá as caras nos consoles.
“
A motivação principal de Aveline, a razão pela qual a garota busca a
verdade, é o nojo que ela sente ao perceber os extremismos da sociedadeO combate não é o maior foco do enredo de Aveline. Os inimigos aparecem em quantidades menores e o combate é simplificado a um botão de ataque, outro de contra ataque, um de chute e um para longas distâncias. A aproximação stealth está presente nos combates, como de praxe, mas com uma mudança interessante aos olhos de quem sempre acompanhou um moço vestido de branco correndo por aí: Aveline pode se disfarçar em Liberation. A protagonista possui três personas diferentes, que podem ser acessadas de pontos específicos do cenário e permitem diversas abordagens as missões. A mecânica é introduzida de maneira bem linear no início do título, mas não demora para que os jogadores possam escolher como preferem realizar os objetivos do jogo.
A moça pode entrar na pele de uma escrava, de uma dama e de uma assassina. Na pele de dama, Aveline perde a habilidade de sair correndo pelos cenários, mas demora a ganhar notoriedade e pode entrar tranquilamente em diversos cenários. Durante os trechos em que está vestida de acordo com as regras de alta-sociedade, é possível perceber todo o processo de adaptação de Aveline no mundo. Em um baile, em específico, escutei uma mocinha se referindo a protagonista de maneira pejorativa, dizendo frases que expressavam todo seu desprezo pela posição ocupada por Aveline. A arte do assassinato na roupa de dama fica por conta de uma zarabatana em formato de guarda-chuva e da habilidade de encantar diversos personagens (de maneira bem canastrona), o que permite que Aveline os leve para cantos isolados e os mate discretamente. Já vestida como escrava, Aveline ganha o privilégio de se movimentar livremente pelos cenários, mas acumula notoriedade de maneira muito fácil e é repreendida por guardas quase constantemente. Para se misturar nos cenários, basta interagir com um grupo varrendo o chão ou trabalhando em mercenarias. Por fim, as vantagens de agir como assassina incluem acesso ao arsenal completo de armas de Aveline.
Assassinatos na palma da mão
Por mais que a história cheia de mistérios, reviravoltas e surpresas consigam segurar até os menos interessados na franquia, Liberation escorrega em diversos momentos. O título chegou ao PlayStation Vita no mercado norte-americano ao lado de Assassin's Creed III, mas a impressão que fica é que nenhum dos dois estava realmente pronto para a data marcada tão estritamente pela Ubisoft. Entre bugs e sequências um tanto quanto apressadas, especialmente no final da história, a jogabilidade consegue surpreender com a quantidade de falhas que fazem os jogadores terem de reiniciar o sistema. Utilizar os dardos lançados pelo guarda-chuva de Aveline é quase infernal, já que é bem provável que a moça simplesmente trave e não se mexa mais após a ação, entre outra extensa listas de travadinhas e complicações na mecânica.
No final do dia, Liberation é a primeira versão portátil fiél a franquia. O jogo possui seus diversos defeitos, mas o trunfo de possuir Aveline, uma protagonista carismática, sinceramente motivada e com uma história forte por trás, faz com que o título entre para a lista de obrigações de qualquer fã de Assassin's Creed ou até os donos de Vita prontos para curtir algo nos moldes de Uncharted, mas com uma mudança de cenário.
Category: Psvita
0 comentários